Coinfecção por covid e influenza deve crescer, dizem especialistas
05/01/2022

O número de casos de dupla infecção por covid-19 e gripe, chamada de “flurona” por parte da comunidade científica, tende a aumentar no Brasil nas próximas semanas, alertam pesquisadores ouvidos pelo Valor. A combinação das duas doenças, que não é uma nova enfermidade, ganhou notoriedade após o governo de Israel notificar um caso na semana passada. Mas especialistas afirmam não se tratar de fato inédito ou inesperado, sobretudo por envolver o vírus da gripe, o influenza. 

Doutora pela Escola de Medicina Tropical de Liverpool com tese sobre o influenza, a bióloga Beatriz Carniel diz que este vírus, ao infectar as células epiteliais do nariz, as rompe, expondo receptores aos quais outros vírus como o Sars CoV-2 podem se conectar e inaugurar infecção paralela. “Não se trata de fenômeno raro. Há várias coinfecções virais que começam pelo nariz, sobretudo quando há presença do influenza”, diz. 

 

A novidade, dizem os pesquisadores, está na escala que o fenômeno pode ganhar à frente, devido à combinação da pandemia de covid-19, alimentada pela variante ômicron, com os surtos de gripe fora de época, em pleno verão, no Brasil. Esses surtos têm relação com o subtipo H2N3 do influenza A, linhagem do vírus da gripe que escapa à proteção conferida pela vacina utilizada no Brasil em 2021 - o que explica a alta dos casos. 

No Estado de São Paulo foram detectados 110 casos em 2021, segundo a Secretaria de Saúde, incluindo 59 na capital. Na cidade do Rio há 17 casos em investigação de “flurona”, diz o secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz. 

No total, o país registrou ontem 19,1 mil novos casos de covid-19 e a média móvel subiu para 9.874 diagnósticos positivos, 223% mais do que o cálculo de 14 dias atrás, segundo levantamento do consórcio de veículos de imprensa. O aumento reflete não só a disseminação da variante ômicron mas também a normalização da divulgação das informações pelos Estados após o apagão de dados do Ministério da Saúde. 

 

Vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai diz que ainda não há dado científico sobre agravamento do quadro em pessoas coinfectadas. O que se sabe, diz ela, é que elas apresentarão sintomas das duas doenças, em boa parte coincidentes. “Não se consegue definir se a dor de cabeça é da covid e o espirro é da influenza. Um dos desafios hoje é o diagnóstico diferencial, baseado em sintomas. O quadro clínico é o mesmo. Ambas podem evoluir para Síndrome Respiratória Aguda Grave [SRAG], que é o que leva à hospitalização.” 

Apesar do cenário mais favorável à dupla infecção, a maior parte dos pesquisadores acredita que hospitalizações e óbitos por “flurona” não devem disparar. O professor de ciências farmacêuticas da Universidade São Paulo (USP), Marco Antônio Stephano, acredita que o contexto de vacinação avançada contra a covid-19, alguma vacinação contra a gripe e a dominância da ômicron, menos letal, deve sustar colapsos no sistema de saúde público, como os verificados no auge da pandemia. 

Parte dos cientistas que se debruçam sobre a coinfecção, diz Beatriz, acredita que as altas temperaturas do verão podem dificultar a proliferação da gripe, o que impediria a explosão dos casos de flurona. Mas Stephano argumenta que a segurança contra a gripe e, portanto, contra a coinfecção, só virá em março, quando começa a vacinação com imunizante atualizado contra H2N3. A princípio a campanha tem como público-alvo crianças e idosos, mas, a depender do cenário, é recomendável que seja expandida a toda a população, diz ele. 

Beatriz aponta a necessidade de se vacinar crianças contra covid-19 e contra gripe. Os estudos clínicos mais relevantes sobre coinfecções virais nesse público, diz ela, acusam prevalências entre 35% e 40%, enquanto a taxa atinge, no máximo, 6% entre adultos. “Por mais que as crianças tenham quadro mais leve de covid, atuam como vetores, perpetuando a transmissão ao resto da população. No caso da coinfecção por gripe e covid, isso acontece duplamente e em maior intensidade, porque elas não estão vacinadas.” (Colaboraram Alessandra Saraiva, do Rio, e Ana Conceição, de São Paulo) 

Fonte: Valor




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