Envelhecimento Populacional
Maria Carolina
03/05/2012
 
A peculiaridade do Brasil frente a exemplos de sucesso como Canadá, Dinamarca e Japão refere-se aos problemas de infraestrutura e educação. Especialista alerta sobre a importância de criar ações sustentáveis e compatíveis com o desenvolvimento econômico do País
 

 
   1. Os tratamentos e tecnologias estão evoluindo para oferecer terapias cada vez melhores e prolongar a sobrevida do paciente. Mas muitas vezes, para um paciente idoso, essa prorrogação do tratamento não inclui qualidade de vida. Por exemplo, deve-se ou não procurar câncer ou outras doenças equivalentes em pacientes idosos assintomáticos? Pois se ele tem 85 anos de idade e se sente bem e é descoberto um tumor, submeter uma pessoa desta idade à cirurgia ou quimioterapia pode antecipar a morte ou oferecer uma sobrevida de sofrimento por conta dos tratamentos. Qual sua opinião sobre o assunto?
 
     Há pouco tempo, uma pessoa de 92 anos, muito próxima a mim, sofreu uma fratura do colo de fêmur.
Antes da cirurgia, os médicos informaram que exames revelaram uma alta em marcadores tumorais:
não seria oportuno aproveitar a intervenção para investigar? Ou esperar a recuperação para realizar
alguns exames intrusivos? Seria um câncer de colon? Decidiu-se não proceder às investigações suplementares. Isso foi há dois anos, e a pessoa se recuperou bem da fratura e está em ótimas condições clínicas, embora com deterioro cognitivo importante. Qual seria a qualidade de vida dela hoje, caso ocorresse a investigação agressiva, que, aparentemente, se impunha? Talvez uma cirurgia abdominal agressiva? Talvez uma colostomia? E se ela vier a desenvolver uma condição grave nos próximos meses, anos?
     São questões difíceis envolvendo ética médica, compaixão e atitudes positivas face ao envelhecimento. Não defendo que um idoso deixe de receber toda a atenção médica que resulte em prolongar a qualidade de vida pelo maior período de tempo possível. Mas, tampouco, defendo atos “ heróicos”, que podem resultar em mais dano que ganho. Sustento toda intervenção, que permita manter a capacidade funcional – ou restaurá-la – ocorra independente da idade. Mas há limites quando existe o risco de prolongar uma vida sem qualidade, quando apenas mais anos se somam à vida.
     Quanto mais avançada a idade no momento da morte, menos cara ela custa. Morrer da mesma condição aos 60 anos custa mais que aos 90. Além disso, o último ou os dois últimos anos de vida são responsáveis por grande parte dos custos totais de cuidados da saúde da maioria dos indivíduos. A conclusão é clara e interessa a todos (indivíduo, família, sociedade, seguro saúde): estender ao máximo o período de vida com saúde, investindo em promoção e prevenção da saúde permitindo que se alcance uma idade avançada com qualidade de vida e com poucos gastos de saúde.
 
     2. Nações como Canadá e alguns países da Europa já estão enfrentando os desafios do envelhecimento da população. O que o Brasil pode trazer de bons exemplos desses países e o que temos que evitar para não cometer erros semelhantes?
 
    A maior parte dos países – com exceção da maioria dos africanos e alguns menos desenvolvidos da Ásia
e América Latina – já enfrenta os desafios do envelhecimento. E nos países como o Brasil, os desafios
são ainda maiores, pois os países desenvolvidos primeiro enriqueceram para depois envelhecer. Aqui,
estamos envelhecendo, mais rapidamente que eles no passado, mas ainda enfrentando problemas que
essas nações já tinham posto de lado à altura de seu processo de envelhecimento.
    As políticas necessárias para fazer face ao nosso envelhecimento ocorrem em paralelo aos problemas de infraestrutura, aos desafios educação e de geração de emprego a um contingente enorme de jovens adultos – muitos deles sem capacidade de entrar no mercado de trabalho formal. Portanto, a experiência do Canadá, Dinamarca ou Japão, por exemplo, é de relevância relativa para nós, pois eles puderam se dar ao luxo de desenvolver políticas que, se adotadas pelo Brasil, levariam ao aumento de desigualdade: beneficiando uns poucos em
detrimento da maioria. Por isso, temos de buscar saídas sustentáveis e compatíveis com nosso nível de desenvolvimento econômico.
    Herdamos políticas absurdas do passado. A seguridade social do funcionalismo público federal, que beneficia em torno de 1 milhão de pessoas causou um déficit de R$ 61 bilhões em 2011 ( o custo é ainda maior, este é apenas o déficit ) e facilmente chegará a R$ 100 bilhões num futuro breve. Isso porque durante a Ditadura Vargas e, mais tarde, o Regime Militar necessitando da lealdade plena dos funcionários públicos (inclusive os militares) implementaram aposentadorias para “não botar defeito”: pensões correspondendo ao salário integral, muitas vezes, pagos16 vezes ao ano, pensões conferidas por tempo de serviço, ou seja, aposentadorias a pessoas de 45, 50 anos que viverão mais 40 com esta benesse. Portanto, não se pode culpar o “ envelhecimento” populacional e, sim, essas políticas, que são inconcebíveis em países muito mais ricos. E o preço é claro – pois o risco é o País se tornar uma Grécia e não uma Alemanha.
 
    3. Estamos passando pelo bônus demográfico e no futuro do País esse bônus se transformará naturalmente em uma população de maioria idosa. Quais políticas poderiam ser adotadas agora
para evitar problemas quando a população idosa superar a população jovem? Por exemplo, alguns
especialistas em previdência falam sobre a criação de uma poupança da saúde (health savings account) quando a pessoa estiver em idade produtiva, para que ela use este recurso quando envelhecer.
 
    Não teremos mais idosos que adultos mais jovens, mas em breve existirá tanto idosos quanto pessoas
de até 15 anos. O bônus demográfico refere-se ao fato de que no momento – e por mais uns poucos
anos – já não teremos tantas crianças para educar e cuidar, mas ainda não há tantos idosos para prover
cuidados e pensões. É uma “janelinha” de oportunidade para se colocar a casa em ordem. Por isso, a
premência de políticas sustentáveis e responsáveis. Se perdermos está oportunidade, ela não se repetirá.
    Há progresso. A Constituição de 1988 assegurou Saúde como um direito de todos, mas falta muito para ser declaradamente boa, apesar de estar muito melhor do que antes. Hoje, o idoso com problemas de saúde exige seu direito ao serviço de saúde. Como também o direito à renda mínima. Praticamente todos com mais de 65 anos, no Brasil, recebem algum benefício, a aposentadoria é virtualmente universal. Os mais pobres têm direito a aposentadorias não contributivas. E passam a ser um recurso crítico para suas famílias. Muitas vezes, são os únicos, na família com uma renda mínima. São agentes do desenvolvimento, pois os 2000 municípios mais pobres do Brasil veem nestas pensões a única fonte
de renda regular.
    Todas as medidas que estimulem a capacidade de nos auto ajudarmos na velhice tem mérito e acredito que uma poupança de saúde traz benefícios importantes para aqueles que a podem pagar. Mas não são todos. Daí a necessidade de um conjunto de ações, algumas que visem os mais ricos
( que podem pagar tal poupança de saúde ) outras que protejam os mais vulneráveis – àqueles que por
culpa própria não tiveram o privilégio de terem contribuído para o INSS. Estes necessitam de políticas
sensatas ainda mais do que aqueles que têm os recursos para buscar alternativas no setor privado.
 
     4. Como a tecnologia pode ajudar o idoso a se tornar mais independente? Esses sistemas de monitoração e tecnologias de telemedicina podem ajudá-lo? O que já existe hoje no Brasil e no mundo que podem auxiliar as pessoas nessa fase da vida?
 
     As respostas tecnológicas podem fazer maravilhas e não necessitamos de exemplos mirabolantes, com custo alto e reservados aos privilegiados. Por exemplo, em edifícios residenciais Brasil afora ainda
existe a figura do porteiro. Tais profissionais já foram identificados pelos idosos em estudos qualitativos como seus “melhores amigos”. Ora, se já são amigos podem ser também mais eficazes adquirindo novas habilidades. Nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, eles já estão sendo treinados e quando este profissional puder usar o interfone como uma tecnologia que permite monitorar os idosos de seu edifício, estamos utilizando tecnologia barata que aumenta a segurança destes moradores vulneráveis. E há muitos exemplos de pequenos “devices” cujo custo esta baixando ano após ano.
     Mas, claro, as tecnologias que permitem acompanhamento à distância, que detectam uma situação de risco em tempo real, que ajudam a serviços antes inexistentes – como a telemedicina – assinala para um envelhecimento ativo e com qualidade de vida.




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