Prevent Senior: o bom momento da empresa na mira da CPI
23/09/2021

Até onde a imagem de uma empresa resiste a investigações, reportagens com denúncias na TV aberta e à convocação de um diretor à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19? Depende. 

Desde 2020, a rede de planos de saúde e hospitais para idosos Prevent Senior é foco de diversos questionamentos quanto ao tratamento da covid-19 em idosos nos seus hospitais na cidade de São Paulo. 

Tudo começou quando o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta disse que nos hospitais da rede estavam morrendo pessoas demais, ainda no começo da pandemia. 

Para a empresa, cujo modelo de negócios foca na assistência de saúde à terceira idade, o motivo da mortalidade alta era justamente o fato de atender pessoas com a saúde em teoria mais frágil.

 

Na ocasião, políticos como o então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, aventavam a utilização de medicamentos como hidroxicloroquina como um tratamento de sucesso contra a doença. No entanto, tudo era novo e não havia conclusões científicas. 

Na Prevent, os pacientes então começaram a ser tratados com um protocolo que reunia a hidroxicloroquina e a azitromicina. Um remédio para malária e artrite reumatóide, e um antibiótico. Segundo a empresa, 630 pessoas foram tratadas com esse medicamento dentro de um projeto de observação dos resultados.

Nesta quarta-feira, o diretor da empresa Pedro Batista Júnior prestou depoimento na CPI em Brasília e passou de “depoente” a “investigado” devido à decisão do relator Renan Calheiros (MDB). 

 

Apesar da crise de imagem que enfrenta há mais de um ano, a Prevent não sentiu muito impacto. 

A empresa vem de um histórico de sucesso, em que um modelo de plano de saúde verticalizado para idosos com preços mais baixos que de planos de saúde convencionais conquistou as famílias paulistanas.

Em 2019, o lucro da empresa foi de 432 milhões de reais. No ano passado, chegou a 496 milhões de reais. Segundo a Agência Nacional de Saúde, órgão federal regulador da saúde suplementar no país, a Prevent Senior ocupa o 5º lugar como bandeira de plano de saúde mais utilizado na região metropolitana de São Paulo. Em primeiro lugar, está a Notre Dame Intermédica.

De junho de 2020 a junho de 2021 (último mês em que a ANS tem dados consolidados), a Prevent Senior teve um crescimento no número de clientes de cerca de 373.000 para 405.000 na região. 

Na visão do consultor em saúde e médico Carlos Suslik, a crise de imagem não deve ter um efeito tão forte porque a empresa é de nicho, domina o segmento e oferece um produto que é visto pelo público como de valor. Apesar de alvo da CPI, ela deve continuar bem, mesmo com o diretor tendo se transformado também em investigado.

“Essa investigação da CPI deve ficar na mídia um tempo e vai sumir. O desgaste vai sumir se não tiver uma prova e informação nova e se a investigação ficar em cima só do que se sabe sobre a recomendação da utilização de hidroxicloroquina em 2020”, diz Suslik.

Para o analista, mesmo uma pessoa que esteja aborrecida com a suposta conduta da empresa teria dificuldades em encontrar opções com o mesmo custo benefício na região de São Paulo, o que privilegia a rede. 

“Esse público que já está com ela vai para onde? Qual é melhor? Quem vai te aceitar com comorbidade? O cliente atual não tem opções melhores e o novo entrante também não tem. A Prevent é nichada, em idosos e em SP, porque aí ela consegue verticalizar e colocar dentro do produto dela”, explica.

Só de hospital da rede própria com nome Santa Magliore, a empresa tem 20 na região metropolitana de São Paulo, já os pronto-atendimentos são oito. Há também núcleos de medicina avançada e de medicina diagnóstica.

A CPI

A CPI da covid-19, comandada pelo relator Renan Calheiros, decidiu convocar a um representante da empresa porque o presidente da República Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo Bolsonaro utilizaram dados dessas pesquisas feita pela empresa em 2020 como forma de justificar o chamado tratamento precoce e a hidroxicloroquina. 

A suspeita é que a rede de planos de saúde tenha aceitado servir como instrumento para o governo federal justificar o remédio, que hoje é comprovadamente um medicamento sem eficácia.

Os parlamentares questionaram nesta quarta-feira também diversos pontos como por que a empresa seguiu com esse teste sem a autorização da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. 

Estudos clínicos são comuns na medicina – mesmo nas instituições privadas –, com a condição de seguir protocolos rígidos de ética médica como conquistar aprovação em comitês médicos e garantir o consentimento dos participantes.

Todo o processo é fiscalizado por auditorias e pode ser interrompido (caso haja óbitos ou alergias graves, por exemplo). E, obviamente, os indícios de eficácia também são fatores decisivos.

“Em fevereiro deste ano, foi publicada uma revisão sistemática que descartou a cloroquina no tratamento da covid-19. Como surgiram evidências maiores, qualquer estudo com o medicamento no combate à doença deveria ser paralisado”, diz Marcello Erich Reicher, professor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp.

Qualquer intervenção, vacina, tratamento ou medicação precisa ser submetido a essas experimentações para serem colocadas em prática, diz Ronald Flumignan, professor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp.

“Os estudos não são apenas comuns, mas obrigatórios para inclusão de qualquer medicamento em determinado tratamento. Só depois dessa avaliação de tecnologia de saúde é incorporado ao SUS”, diz Flumignan.

Segundo o diretor Batista Júnior, não foram feitos testes com pacientes, mas apenas “observaram o ato médico”. 

Em abril deste ano, uma reportagem da TV Globo mostrou denúncias de ex-médicos da rede sobre uma possível interferência da empresa na conduta dos profissionais de saúde. Segundo a denúncia, a empresa estava forçando médicos a receitarem o chamado “kit-covid”, mesmo depois de estudos internacionais terem mostrado a ineficácia da droga hidroxicloroquina.

Segundo a empresa, as denúncias são mentira e todos os médicos têm autonomia para receitar como bem entenderem, e que a rede fez apenas recomendações.

Ao indagar o diretor da Prevent Senior, o senador Humberto Costa (PT-PE) disse ter ficado claro que a empresa aceitou ser usada pelo governo como um importante espaço para legitimar uma “política negacionista e contrária ao isolamento social”. 

Início em ambulância e expansão recente

As atividades fora de hospitais e consultórios são parte importante do modelo de negócios da Prevent Senior. A empresa foi fundada há 24 anos na Mooca, na zona leste de São Paulo, pelos irmãos Eduardo e Fernando Parrillo — até hoje a família é a única dona do negócio. Começou como um serviço de ambulância e evoluiu para o atendimento médico. A operadora sempre teve foco no público da terceira idade.

Pelo modelo de negócios da Prevent Senior, cada paciente tem um médico tutor, cuja especialidade varia de acordo com a necessidade. Se a pessoa tem um problema no coração, o tutor provavelmente será um cardiologista. A operadora promove, ainda, encontros para falar sobre temas como prevenção a queda, doenças específicas e cuidados após uma cirurgia. Com isso, diz ter reduzido o tempo de internação, assim como a relação entre o número de beneficiários e o número de leitos na rede própria, que caiu 40%.

Nos últimos anos, tem impressionado pelos resultados em um setor que luta contra a alta nos custos dos tratamentos. O faturamento foi de 1 bilhão de reais, em 2014, para 3,5 bilhões, em 2019. A operadora teve faturamento de 2 bilhões de reais entre janeiro e junho de 2020, crescimento de 17% em relação ao mesmo período do ano passado, quando faturou 1,7 bilhão de reais. Isso com uma carteira que outras operadoras pagariam para não ter.

Na opção mais em conta (Premium 1001 Enfermaria), o plano é oferecido a 251 reais para clientes com até 18 anos de idade, enquanto o plano mais caro (Premium 1001 Apartamento) custa 1.305 reais para pacientes acima dos 59 anos.

Em 2021, a Prevent Senior prevê investir 350 milhões de reais, incluindo a abertura de quatro novas unidades hospitalares. A empresa está em vias de operacionalizar um novo hospital na região do Morumbi, na zona sul de São Paulo, desenhado para ter suítes exclusivas para os acompanhantes de pacientes internados. A unidade está agora em fase de treinamento dos funcionários.

Atualmente, a empresa tem dez hospitais da rede Sancta Maggiore, que totalizam 37 unidades do grupo – como núcleos de medicina avançada, diagnóstico por imagem, oncologia, ortopedia e reabilitação. e, além da capital paulista, a Prevent Senior também está no Rio de Janeiro (RJ), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS) e Brasília (DF).

O que diz a Prevent Senior

Sobre a CPI desta quarta-feira, a Prevent Senior enviou uma nota à EXAME afirmando que nega e repudia denúncias levadas anonimamente à CPI da Covid e à imprensa.

Por isso, a empresa pediu nesta segunda-feira que a Procuradoria Geral da República investigue as denúncias, como as que falam que a empresa forçou médicos a receitarem a hidroxicloroquina. "Devido à estranheza da abordagem, a Prevent Senior tomará todas as medidas judiciais cabíveis para esclarecer os fatos e reparar os danos a sua imagem".

– Colaborou Gabriel Aguiar

Fonte: Exame




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