No dia 24 de junho do ano passado, a presidenta Dilma Rousseff usou a rede de rádio e televisão para apresentar cinco pactos em resposta à onda de protestos no País: responsabilidade fiscal e controle da inflação; investimentos em saúde e contratação de médicos estrangeiros; destinação de 100% dos royalties do petróleo para a educação; recursos para mobilidade urbana e a convocação de uma Constituinte sobre reforma política.
Um ano depois, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, avalia que o principal pacto – o da reforma política – “bateu na trave”. Após desistir da convocação de uma Constituinte para a reforma política, a presidenta enviou mensagem ao Congresso Nacional com sugestões de mudanças no sistema eleitoral, como financiamento de campanha, sistema de eleição de deputados e novo regime de coligações. “Não houve nenhum debate lá dentro mais acalorado, simplesmente não foi adiante”, criticou o ministro.
Questionado se faltou pressão por parte do governo para efetivar a proposta, ele disse: “Talvez pudéssemos ter pressionado mais. Eu posso dizer que os partidos mais à esquerda poderiam ter feito mais militância nisso, eu acho que faltou. Faltou um pouco mais de empenho dos partidos”, disse Carvalho.
Para ele, o pacto sobre responsabilidade fiscal não gerou ações concretas. Já os pactos da saúde, da mobilidade e da educação foram parcialmente cumpridos. Na saúde, houve a concretização do Programa Mais Médicos, que já vinha sendo formulado pelo governo. No caso da educação, foi aprovada a destinação de 75% dos royalties do petróleo e mais 50% do Fundo Social do Pré-Sal. Em relação à mobilidade, foi feito investimento de R$ 50 bilhões, destinados sobretudo para as sedes da Copa do Mundo. Para o ministro, os dois últimos pactos devem começar a mostrar resultados nos próximos anos.
Especialistas e movimentos sociais, por outro lado, criticam o que consideram a não execução dos pactos. O cientista político Leonardo Barreto avalia que os Três Poderes deveriam ter implementado uma agenda de reformas para responder à sociedade e retomar o diálogo. Essa agenda, avalia, deveria conter ações contra a impunidade e que garantissem reforma política, a prioridade de gastos com serviços públicos e mais transparência das ações do Estado.
“Para transformar isso em uma plataforma reformista, você tem que se comprometer com certas coisas que vão contra o status quo da própria classe política”. O estudioso considera que nenhum governo ou político conseguiu responder àquele processo e que a população voltou para casa sem as conquistas pretendidas. “O que me preocupa é a nossa incapacidade de achar soluções, e os problemas vão se acumulando. E hoje eu vejo o país muito imobilizado, as próprias lideranças políticas não mostram muita força”, critica Barreto.
O Movimento Passe Livre (MPL), que coordenou em junho do ano passado as manifestações em defesa da redução da tarifa do transporte público em São Paulo, também critica a postura do governo. “A presidenta fez uma mesa para ouvir o MPL, mas não tomou nenhuma atitude de garantir o direito ao transporte das pessoas”, afirmou Lucas Oliveira, um dos integrantes do movimento. Por outro lado, o MPL contabiliza vitórias. Além da redução das tarifas, o ativista destaca a aprovação da Emenda Constitucional nº 90, que dá nova redação ao Artigo 6º da Constituição Federal e inclui o transporte como direito social.
Outras conquistas também foram obtidas pelos ativistas, como a retirada de pauta da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 37, que retiraria o poder de investigação do Ministério Público, e o projeto que ficou conhecido como “cura gay”.
Sandra Quintela, integrante do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs) e da Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa (Ancop), aponta como vitória desse ano de lutas a divulgação das violações vivenciadas no contexto de preparação para a Copa do Mundo, por meio de relatórios e atos organizados pelos movimentos locais e pela Ancop, bem como a conquista de moradia e a diminuição das remoções, em cidades como Fortaleza.
Do ponto de vista das mobilizações, o MPL avalia que junho permitiu o crescimento das lutas urbanas, expressas nas ocupações, e também o diálogo entre trabalhadores do transporte público e os usuários do transporte.
O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) também é otimista ao analisar os protestos. Para o coordenador nacional do MTST, Guilherme Boulos, os protestos de junho abriram uma nova conjuntura para as lutas sociais do país.“As mobilizações de junho reabilitaram essa legitimidade da luta social para a consciência popular. Até porque as pessoas viram que a massa foi para rua e a reivindicação foi alcançada: a tarifa baixou no país todo”.
Ele conta que, desde junho do ano passado, “a quantidade não só de ocupações de terra, mas de greves e de mobilizações populares que ocorreram, foi muito mais expressiva que no período anterior. Isso é importante, é um avanço, demonstra um despertar dos trabalhadores de forma mais organizada”.