Desafios para a saúde suplementar e o futuro do Sistema Unimed
25/02/2021

Fundada em 1967, a Unimed se tornou a grande responsável pelo atendimento de mais de um terço dos brasileiros com planos de saúde no Brasil. Ainda hoje, o sistema Unimed atende mais de 19 milhões de brasileiros em mais de 84% do território nacional.

Mas, ao longo dos últimos anos, a operadora vem sofrendo um forte ataque concorrencial, que se intensificou muito nos dois últimos anos através da consolidação do mercado feita pela GNDI e pela Hapvida – e que será ainda mais devastador com a aprovação da fusão das duas empresas.

Antes de analisarmos as possíveis alternativas para que eles possam se defender deste ataque predatório, é preciso entender o sistema Unimed e suas complexidades.

Existem mais de 300 Unimeds – chamadas “singulares” – que atendem um ou um grupo de municípios. Cada estado conta com uma federação e, nacionalmente, uma confederação integra o sistema, além de também existir uma seguradora e uma empresa de planos odontológicos.

Além da complexidade do sistema, as Unimeds não são empresas comuns: tratam-se de cooperativas de médicos que, juntos, se tornam sócios destas Unimeds singulares e passam a atender os usuários destas cooperativas.

Por ser uma cooperativa, todo o corpo diretivo tem que ser eleito e tem mandato de alguns anos (normalmente quatro). Estes médicos passam a fazer parte do corpo diretivo e, ao mesmo tempo, continuam atendendo (na maioria dos casos) em suas clinicas – o que, por si só, já causaria um conflito de interesses em qualquer empresa normal, por mais bem-intencionada que seja essa equipe diretiva.

Passado seu período de gestão, é feita uma nova eleição e, não raro, se muda todo o planejamento feito pela gestão anterior.

Outro ponto de complexidade se dá no atendimento entre Unimeds. Cada região tem sua Unimed que, à principio, é independente e atende na sua localidade. Atende, também, usuários em trânsito de outras Unimeds via intercâmbio. Muitas delas têm menos de 30 mil usuários e, muitas vezes, se torna devedora de outras singulares do sistema por falta de recursos – o que inclusive já contribuiu com problemas financeiros, como foi o caso na falência da Unimed Paulistana.

Outro complicador é a forma de pagamentos dos prestadores. Enquanto a concorrência contrata médicos com o menor custo possível e os paga via pessoa jurídica e emissão de nota fiscal, os pagamentos na Unimed são feitos para os sócios cooperados no sistema como pessoa física – o que encarece, e muito, o custo dos serviços prestados.

Não há nada de errado nesta relação, mas há uma constatação do ponto de vista financeiro: o médico, ao mesmo tempo em que é sócio da companhia, atende o cliente dela. Sua principal fonte de renda, contudo, vem do próprio atendimento. Qual vai ser a decisão em uma assembleia para decidir qual vai ser a remuneração dos médicos? Economizar para a Unimed, pagando menos pelo atendimento, ou pagar bem ao médico em detrimento da operação?

Dito tudo isto, qual é o futuro do sistema Unimed e quais opções seriam viáveis para que eles possam se defender e crescer em um mercado cada vez mais concorrido?

Não há uma bala de prata, mas algumas sugestões podem ser dadas aos dirigentes deste gigante do setor, por uma pessoa que está do lado de fora do sistema:

1- Simplificação do modelo

Imagine um cenário em que só houvesse uma Unimed – como muitos dos usuários enxergam -, que tivesse uma rede credenciada em 84% do território nacional com 126 hospitais próprios à disposição dos clientes, com produtos regionais e nacionais?

2- Unificação das Unimeds

E se fosse possível, ao invés de existir mais de 300 Unimeds, existir apenas uma? Apenas um corpo diretivo, uma estratégia, uma equipe de gestão médica, uma equipe de gestão nacional, um único setor de compras e assim por diante. Qual seria a economia com esta mudança? Quanto sobraria para investimentos? Qual o ganho de sinergia? E o ganho de marketing?

3- “Pejotização” e saída do modelo de cooperativismo

Alguns vão defender que existe algum ganho tributário, mas quanto se perde com este modelo? A simples mudança dele, se possível, traria um ganho tributário gigantesco para a companhia. Imagine a economia para todos no sistema? O simples fato do pagamento do médico ser feito via nota fiscal traria uma economia gigantesca para ambas as partes.

4- Gestão central e transformação das Unimeds singulares em distribuidoras e franquias regionais

Se toda a gestão fosse simplificada e unificada, como falado, imagine o quanto a equipe da Unimed singular poderia se dedicar a trazer novos negócios ou se dedicar a atender melhor o cliente final? Só há ganho do ponto de vista financeiro e operacional, sendo o grande problema de cunho politico: como deixar de ser o PRESIDENTE para ser o responsável pela região?

Os gestores regionais precisarão entender que, para competir no novo mercado, precisarão mudar a forma de olhar para o negocio e perceber que serão muito mais importantes para o sistema do que são hoje.

5- Criação de um laboratório nacional de análises clínicas e uma área de OPME nacional

Dois grandes custos das operadoras são, em primeiro lugar, com OPME (Órteses, Próteses e Materiais Especiais: insumos utilizados na assistência à saúde e relacionados a uma intervenção médica, odontológica ou de reabilitação, diagnóstica ou terapêutica), que seriam radicalmente reduzidos se as compras destes produtos fossem centralizadas nacionalmente; em segundo, com exames laboratoriais, que muitas vezes são direcionados para um laboratório parceiro local sem análise de custos – que seriam muito mais baratos se centralizados em um único laboratório próprio.

6- Criação de uma UNIMED S/A, com todos os cooperados como acionistas diretos desta nova companhia nacional, e o encerramento de todas as cooperativas

Apesar da Unimed já ter uma S/A, o modelo tem uma complexidade muito grande e apenas alguns negócios das cooperativas estão nesta companhia. Isto impede que ela possa abrir capital e financiar seu crescimento, como tem feito seus principais concorrentes.

Somente do ponto de vista de reserva técnica necessária para se obter o registro de operadora de planos de saúde, a unificação da Unimed tenderia a liberar muitos recursos, presos hoje pela complexidade do sistema, para esta transformação da companhia.

Por fim, sei da complexidade do tema e da superficialidade deste artigo do ponto de vista das particularidades regionais e financeiras de cada Unimed. Contudo, faço aqui uma provocação:

Quanto valeria, na bolsa de valores, uma companhia com mais de 19 milhões de clientes, governança corporativa ajustada; com um único presidente e um só corpo diretivo de mercado; com mais de 300 regionais espalhadas pelo país para distribuir e atender as demandas regionais, mais de 100 mil médicos acionistas, além de um laboratório nacional, uma faculdade, uma seguradora, uma operadora de planos odontológico e mais de 120 hospitais próprios?





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