J. Michael Pearson, diretor-presidente da Valeant Pharmaceuticals International Inc., vem dizendo que reduziria os gastos com pesquisa da Allergan Inc. se a oferta hostil que fez para adquirir a farmacêutica for bem-sucedida. Mas Pearson parece gostar de pelo menos uma das prioridades de P&D da Allergan: continuar buscando novos usos para o Botox.
O produto da Allergan se tornou uma marca reconhecida mundialmente ao ser usado por estrelas de Hollywood em tratamentos para eliminar rugas. Mas 54% das vendas do remédio vêm de outras aplicações, inclusive tratamentos para enxaquecas crônicas e incontinência urinária. E suas vendas para esses usos cresceram 17% no ano passado, em comparação com um avanço de 8% nas vendas de cosméticos.
A Allergan está investindo agressivamente para continuar ampliando o uso do Botox no combate a outras doenças, desde paralisia cerebral em jovens até ejaculação precoce e depressão, que, segundo alguns médicos, poderia ser aliviada inibindo-se a capacidade de franzir o rosto.
É uma estratégia que o líder da Valeant parece aprovar: "Tentaremos obter o maior número de indicações [de tratamentos] que pudermos", disse Pearson sobre o Botox, numa entrevista coletiva em abril, ao anunciar a oferta de aquisição hostil de US$ 46 bilhões que a Valeant fez pela Allergan em parceria com a firma de investimento Pershing Square Capital Management LP. "O grande gerador de valor é o Botox."
Na semana passada, a Allergan recusou formalmente a oferta de aquisição. A Valeant, por sua vez, ameaçou levar a oferta diretamente aos acionistas da Allergan, mas afirmou que vai apresentar uma oferta melhorada pela empresa no fim deste mês, durante uma apresentação para investidores.
Cerca de 25 anos após o lançamento do Botox no mercado americano, a receita com o produto continua subindo, alcançando US$ 2 bilhões no ano passado, 9% a mais que em 2012. Até o fim de 2018, o faturamento global do Botox deve chegar US$ 3,15 bilhões por ano, preveem analistas da Sterne Agee & Leach Inc.
A Allergan está realizando testes clínicos do Botox para quatro novas indicações. A empresa informou, numa apresentação recente para investidores, que gastou perto de US$ 200 milhões em 2013 no desenvolvimento de novas indicações para o Botox, ou cerca de 19% do seu orçamento de pesquisa e desenvolvimento.
"O futuro [do Botox] é ainda muito, muito brilhante", diz David Pyott, diretor-presidente da Allergan, numa entrevista ao The Wall Street Journal.
Pyott também questionou se a Valeant será capaz de financiar o teste clínico do programa em vista dos cortes ambiciosos de custos que propôs. Em abril, a Valeant afirmou que reduziria as despesas com P&D da empresa combinada em 69%. "No longo prazo, haveria muitos [novos usos do Botox] que simplesmente não aconteceriam", disse Pyott.
Laurie Little, porta-voz da Valeant, diz que a empresa acredita "em programas que estendem a vida de um composto comprovado, e está muito interessada em buscar novas indicações para o Botox". A Valeant deve detalhar seus planos de P&D para a Allergan na apresentação a investidores no fim do mês, diz ela.
Pearson, o líder da Valeant, em grande parte descartou os benefícios de investir em P&D, expandindo a empresa através de uma série de fusões e aquisições, inclusive a compra da Bausch & Lomb no ano passado, num negócio avaliado em US$ 8,7 bilhões. Enquanto as grandes farmacêuticas geralmente investem até 20% de sua receita em P&D, a Valeant gastou somente 2,7% dos US$ 5,77 bilhões que faturou em 2013. Em vez disso, a empresa busca adquirir marcas, como o Botox, que já estão no mercado e usar sua ampla estrutura de vendas para roubar mercado dos rivais.
Investir em P&D para expandir um produto que já está no mercado e é bastante conhecido por médicos e pacientes como é o caso do Botox é menos arriscado que investir numa droga completamente nova. Para começar, o Botox já passou por anos de coleta de dados que mostram que o produto é relativamente seguro.
É verdade que, mesmo que a Allergan obtenha aprovação para novos usos do Botox, alguns médicos permanecem céticos quanto ao medicamento. Jeffrey Jackson, professor da Faculdade de Medicina do Estado de Wisconsin diz que estudos clínicos mostraram que o Botox apresentou apenas uma vantagem marginal em relação ao placebo na prevenção de enxaquecas. "É terrivelmente caro e precisa ser [injetado] repetidas vezes" com uma frequência de alguns meses, diz.
O Botox é feito a partir de uma toxina botulínica, um tipo de veneno criado por bactérias e que ataca o sistema nervoso. Mesmo se consumida em doses moderadas, a toxina pode causar botulismo, uma doença geralmente fatal. Em doses pequenas e calculadas, entretanto, a droga simplesmente paralisa temporariamente músculos que médicos e pacientes queiram desativar.
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